Favaretto & Schmidt
Entre em contato (48) 3035-7772

Siga-nos nas Redes Sociais:

Empresário: A reforma tributária vai fazer do Estado seu maior herdeiro

Em outubro de 2024 publiquei um artigo sobre como as mudanças implementadas com a reforma tributária estão tramitando em ritmo acelerado e alguns dos perigos que ela traz para a classe empresária. Neste artigo será possível identificar outras repercussões negativas do PLP 108/2024 em relação ao ITCMD, o malfadado imposto sobre heranças e doações.

É comum ouvir dos empreendedores que o Estado é praticamente um sócio que compartilha os lucros sem correr nenhum risco da atividade empresária. E, de fato, essa frase contém uma grande verdade, visto que no Brasil a taxa de mortalidade das empresas é muito elevada. O Estado brasileiro, todavia, nunca morreu, mas também não podemos dizer que ele tem manifestado uma vida vigorosa. A impressão é que vive com o suporte de equipamentos.

O risco da atividade empresária no Brasil é tão grande que o SEBRAE (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) utiliza a expressão taxa de sobrevivência e de mortalidade em seu website (clique aqui), para citar dados estatísticos sobre o fechamento prematuro de empresas no país.

Não bastasse o Estado ser o sócio indesejado de todo o empresário, agora o seu interesse é ser também o principal herdeiro. Dizer que o Estado vai ser o maior herdeiro pode parecer um exagero mas infelizmente não é. A legislação atual já permite que o Estado abocanhe até 8% do patrimônio com valor de mercado atualizado na data da morte de um cidadão, mediante a incidência do tributo causa mortis. O percentual de 8% é significativo e, somado aos outros custos envolvidos em um inventário (taxas, emolumentos, honorários de advogado, cartório de registro de imóveis, ganho de capital na venda de imóveis, etc), o impacto global das despesas pode reduzir em até 40% o patrimônio de uma família.

A afirmação de que o Estado será o principal herdeiro tem origem nas modificações das principais fontes de arrecadação pela reforma tributária. Atualmente os Estados da Federação dedicam grande esforço do seu aparato fiscalizatório para o ICMS, que é o principal tributo. No caso de Santa Catarina, conforme pode ser visto no Portal da Transparência, o valor total bruto arrecadado em 2024 até a data da publicação do presente artigo foi de R$64.304.601.858,92 e, o valor de R$41.093.830.042,80 representa o valor bruto arrecadado a título de ICMS. Utilizando esses números como referência, percebe-se que o ICMS corresponde a 63,90% do total da arrecadação de Santa Catarina.

Entretanto, a reforma prevê a extinção do ICMS. O tributo que é a fonte principal da receita dos Estados deixará de existir. Quando isso ocorrer, os Estados serão obrigados a dedicar seus esforços para outros impostos, com a finalidade de compensar as perdas. Um dos alvos dessa iniciativa é o imposto de herança e doações, que tende a assumir maior destaque após a aprovação do PLP 108/2024.

E afinal, como a reforma tributária do ITCMD pode tornar o Estado o principal herdeiro dos empresários?

Em primeiro lugar é preciso reforçar que os empresários são titulares de quotas das suas sociedades empresárias. Essas quotas possuem um valor econômico e estão sujeitas ao processo de inventário no caso de óbito do titular. Para melhor ilustrar, digamos que João, um empresário casado pelo regime da separação total de bens, seja titular de 99% do capital social de R$5.000.000,00 (cinco milhões de reais) de uma construtora.

O valor nominal das suas quotas é de R$4.950.000,00 (quatro milhões novecentos e cinquenta mil reais), porém, na legislação de Santa Catarina não é esse valor nominal que deve ser submetido à tributação de herança. O primeiro susto da família desse empresário é descobrir que o valor das quotas da empresa deve ser avaliado ao valor de mercado para depois ser tributado. Geralmente os Estados utilizam como base da avaliação de mercado o patrimônio líquido da empresa na data do óbito. Nesse caso, se a construtora tiver um patrimônio líquido de 50 milhões, é esse valor que servirá de referência para incidência da alíquota do imposto de herança.

A participação de 99% de João no patrimônio líquido de 50 milhões corresponde a R$49.500.000,00. Logo, se João falecer e tiver um único herdeiro, segundo as alíquotas progressivas de tributação em Santa Catarina, seu filho terá que suportar a tributação de R$3.460.599,98 a título de ITCMD. Muito embora o patrimônio líquido seja elevado, dificilmente uma empresa tem mais de três milhões em caixa disponíveis para o pagamento de imposto. Quanto maior a empresa e seu patrimônio líquido, maiores as suas obrigações com funcionários, colaboradores e compromissos financeiros de projetos em andamento. Nesse sentido, o valor atualmente exigido a título de ITCMD já representa um fatia considerável da empresa, que pode até mesmo tornar sua operação inviável.

Mas o Grande Leviatã quer sempre mais. Em segundo lugar, o poder executivo e congresso nacional, com apoio da mídia, defendem que o teto de 8% para tributação de heranças e doações no Brasil deve ser majorado. Especula-se que após a aprovação da reforma tributária a alíquota será ampliada para algo entre 16% e 20%. Os argumentos veiculados pelos defensores dessa espoliação institucionalizada são variados e serão abordados em outro artigo. Mas o fato é que um aumento dessa proporção tornará o Estado o maior herdeiro de todos os cidadãos, apenas com o recolhimento direto do ITCMD, sem falar nos outros tributos indiretos que estão atrelados a um processo de inventário. Utilizando os números do exemplo acima do empresário João, o tributo de ITCMD devido no eventual aumento da alíquota para 16% poderia facilmente superar a cifra de seis milhões de reais.

É dentro desse contexto que o Estado surge como o maior rival dos herdeiros. Qual dos filhos tem a opção de receber sua parte 100% em dinheiro, com a preferência de desfrutar dos recursos antes de todos os demais e sem nunca ter colaborado para aquela família? Os herdeiros não podem, mas o Estado pode tudo isso. Onde estava o Estado quando aquela família quase foi à ruína? Teria ele participado também dos prejuízos, ou, ele somente aparece na distribuição dos lucros? Quais dos seus “direitos” o Estado abriu mão em prol da harmonia familiar?

Diante desses fatos e da reforma tributária que se avizinha, os empresários devem procurar assessoria especializada para planejar a sucessão dos seus negócios. Como mencionado em meu último artigo, aqueles que deixarem de efetuar um planejamento sucessório preventivo sofrerão graves consequências em sua atividade comercial, com reflexos consideráveis na estabilidade financeira de suas famílias.

 

>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>

CICERO ANTONIO FAVARETTO é advogado especialista em direito tributário e planejamento patrimonial e sucessório, com ênfase na estruturação de holdings familiares.

OAB/SC nº28.059